"Pela rua Cimo de Vila" - Águas Frias - Chaves - Portugal
Mário Silva Mário Silva
"Pela rua Cimo de Vila"
Águas Frias - Chaves - Portugal
A Rua Cimo de Vila, em Águas Frias, Chaves, era mais do que uma simples artéria de passagem; era um livro aberto sobre a alma da aldeia, um testemunho vivo de tempos passados e da resiliência das suas gentes.
Ao amanhecer, a luz do sol de julho esgueirava-se sobre os telhados, espreitando por entre as copas das árvores no topo da colina, e beijava as pedras que formavam a rua e as paredes.
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Era uma calçada de paralelepípedos, ou "cubos" como lhe chamam por estas bandas, que subia em suave inclinação, cada pedra polida pelo passar dos anos, dos carros de bois, dos passos apressados e dos passeios lentos.
As suas juntas, por vezes preenchidas por musgo teimoso ou por pequenas ervas, contavam a história de uma manutenção constante, mas também de uma vida que persistia.
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À esquerda, um muro imponente de pedras de granito, robustas e irregulares, erguia-se, formando a lateral de uma antiga habitação.
As pedras, umas mais claras, outras mais escuras, encaixavam-se com uma precisão que só as mãos de mestres canteiros sabiam dar, sem argamassa aparente em muitos pontos, mas firmes como a própria montanha.
Era uma parede que respirava história, que tinha testemunhado invernos rigorosos e verões abrasadores, que tinha acolhido famílias e guardado segredos.
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Junto a este muro, numa faixa estreita de terra que parecia desafiar a robustez da pedra, a vida brotava em abundância.
Malvas-rosas (Alcea rosea), algumas de um rosa delicado, outras em tons mais vibrantes de fúcsia, estendiam-se para o céu, os seus botões e flores abertas a trazer cor a um cenário dominado pelo granito e pelo verde escuro.
Ao lado delas, repolhos e couves, de folhas largas e um verde intenso, cresciam vigorosos, plantados ali com a praticidade de quem aproveita cada palmo de terra.
Era um pequeno jardim à beira da rua, um reflexo da simbiose entre a vida rural e a habitação.
Uma janela de madeira simples, com as suas portadas fechadas, interrompia a parede, sugerindo uma vida interior, talvez uma cozinha acolhedora ou um quarto com vista para o vale.
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À direita, a rua continuava, com um muro semelhante, embora menos visível, a delimitar outros terrenos e casas mais à frente.
A perspetiva da rua, que se perdia na distância, subia suavemente, ladeada por mais vegetação, e ao longe, vislumbrava-se o topo de uma casa mais moderna e os verdes densos da floresta que coroava a encosta.
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A Rua Cimo de Vila não era uma atração turística grandiosa, mas sim um pedaço autêntico de Portugal profundo.
As pedras, as plantas, os muros – tudo falava de uma vida simples, enraizada na terra e nas tradições.
O cheiro a terra húmida misturava-se com o aroma das flores e o sussurro do vento entre as folhas, criando uma sinfonia natural que convidava à contemplação.
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Para Mário Silva, este local era mais do que uma fotografia.
Era a captura de um instante de eternidade, a beleza da arquitetura popular e da natureza que insiste em florescer onde menos se espera.
Era um convite a desacelerar, a sentir a textura das pedras sob os pés, a respirar o ar puro e a deixar-se envolver pela tranquilidade e pela história que cada recanto da Rua Cimo de Vila, em Águas Frias, tinha para oferecer.
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Texto & Fotografia: ©MárioSilva
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