"Caminho para onde?" e uma estorieta
Mário Silva Mário Silva
"Caminho para onde?"
e uma estorieta
Esta fotografia de Mário Silva, intitulada "Caminho para onde?", convida à contemplação e à imaginação, apresentando um caminho de terra batida que serpenteia por um cenário natural exuberante.
O caminho divide-se em dois trilhos paralelos, sugerindo a passagem de veículos ou a formação devido ao uso contínuo, e está ladeado por vegetação densa.
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Em ambos os lados do caminho, predominam fetos e arbustos de um verde vibrante, que parecem estar no auge da sua folhagem, preenchendo grande parte do quadro e criando uma sensação de natureza selvagem e intocada.
O caminho é irregular, com algumas poças de água que refletem o céu, indicando que pode ter chovido recentemente ou que o terreno é propenso a acumulação de água.
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Ao longe, o caminho desaparece numa curva, insinuando mistério e a promessa de algo além.
No horizonte, avista-se uma linha de árvores mais altas e densas que formam um bosque ou floresta, contribuindo para a profundidade da imagem.
O céu, visível na parte superior, é parcialmente nublado, com tons de branco e cinzento claro, mas com a luminosidade suficiente para realçar o verde da vegetação.
A imagem transmite uma sensação de tranquilidade e aventura, convidando o observador a imaginar os destinos que este caminho pode levar.
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A Estória: O Sussurro do Caminho Esquecido
O caminho, com os seus dois trilhos paralelos de terra molhada e poças cintilantes, estendia-se como um convite silencioso para o desconhecido.
Chamavam-lhe "O Caminho Esquecido", pois poucos se aventuravam por entre os fetos altos e as densas moitas que o ladeavam.
Mas para Lúcia, uma jovem de espírito inquieto e alma de exploradora, era o caminho para todas as perguntas e todas as respostas.
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Todos os verões, Lúcia voltava à casa da avó, aninhada à beira da floresta, e o Caminho Esquecido era o seu primeiro destino.
Não era um caminho para chegar a algum lugar em particular – uma aldeia vizinha, um ribeiro secreto – não.
Era um caminho que se destinava apenas a ser percorrido, a ser sentido.
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Hoje, as poças eram mais brilhantes, refletindo um céu que prometia sol, mas ainda guardava nuvens de uma chuva recente.
Lúcia sentiu a terra macia sob os seus velhos ténis e respirou fundo o cheiro a terra molhada e a vegetação selvagem.
Os fetos, luxuriantes e quase da sua altura, pareciam sussurrar segredos antigos enquanto ela passava.
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Lúcia imaginava as histórias que aqueles trilhos poderiam contar.
Quantos pés já as haviam pisado?
Caçadores, pastores, talvez até amantes que se encontravam em segredo nas profundezas da floresta.
O caminho ondulava à sua frente, desaparecendo numa curva misteriosa, sempre a prometer algo mais.
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Um dia, quando era apenas uma criança, Lúcia atreveu-se a ir mais longe do que o habitual.
Seguindo o caminho para além da terceira curva, encontrou uma clareira escondida, onde um velho carvalho se erguia majestoso, com um banco de pedra gasto pela erosão aninhado nas suas raízes.
Não havia sinal de que alguém ali fosse há anos, mas o lugar emanava uma paz profunda.
Ali, sob o carvalho, ela tinha encontrado o seu refúgio, o lugar onde a curiosidade a levara a uma serenidade inesperada.
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Agora, dezoito anos depois, Lúcia regressava ao Caminho Esquecido não só para reviver memórias, mas para encontrar novas direções na sua própria vida.
Aos trinta anos, com decisões importantes a tomar sobre a sua carreira e o seu futuro, o barulho da cidade parecia sufocá-la.
A quietude do caminho, os sussurros dos fetos e a promessa do que estava para além da próxima curva eram um bálsamo.
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Ela caminhou sem pressa, deixando que a natureza a guiasse.
Ao chegar à terceira curva, o familiar vislumbre do carvalho e do banco de pedra acenou-lhe.
Sentou-se ali, fechou os olhos e sentiu a brisa suave.
A resposta não veio numa voz, mas numa sensação – a mesma sensação de clareza e de possibilidade que sentira quando era criança.
O caminho não a levava a um lugar físico, mas a um estado de espírito, à certeza de que, tal como os trilhos sinuosos, a vida também se desdobra em caminhos inesperados, e que o importante não é saber para onde se vai, mas ter a coragem de continuar a caminhar.
O Caminho Esquecido era, afinal, o caminho para si mesma.
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Texto & Fotografia: ©MárioSilva
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